terça-feira, 23 de agosto de 2016



Veinha da carimã
E ela passava bem cedinho pela rua ,com seu balde de alumínio que reluzia aos primeiros raios de Sol ,ornado de um pano alvinho , que mais parecia um pedaço das nuvens .
E a mamãe fazia um de nós ,ir ao portão atucalhar a veinha da carimã , cabelos longos presos a um cocó no alto de sua alva cabeça , corpo franzino , voz doce e de pouca sonoridade , uma alma tranquila que muito contribuiu para fortificar os filhos e filhas do Seu Brasil .
Tinha nome de flor , Flor Cecília ,
mas era mesmo conhecida como a veinha da carimã ...
E com suas mãos finas e enrugadas ,moldava os bolos da carimã alva e limpa , passava de uma mão para outra,
de uma mão para outra,
de uma mão para outra ,
num ritmo mágico e encantador , até formar as tão cobiçadas bolinhas de carimã .
Contava dez bolinhas generosamente espessas e lisas ,e recebia dez moedas ,e saia com um sorriso de grande satisfação ...
E assim foi por longos anos .
E o amanhecer era farto,
mingau de carimã ,
bolo de carimã ,
bolachinha de carimã,
café ,leite e a vida seguia ,fluía , e assim a gente vivia .
E de onde vinha a veinha da carimã ?
Que horas acordava ?
Teria filhos ?
Filhas ?
Até que um dia não veio mais ...
Para onde foi a Flor Cecília ?
Hoje me pergunto ...
Ele existia ?
Ou era somente ...
PURA MAGIA .

sábado, 6 de agosto de 2016

Fantasmas 

Só quem viveu e ainda vive lá naquele encantado lugar
pode entender esses raios de vida .
Talvez sejam rastros daqueles que se foram, e que teimam
em voltar ,vez em quando .
Voltam em forma de brisa , ou como uma gota de orvalho
que mancha a branca camisa .
Ainda posso ouvir o barulho das crianças correndo e brincando,
a chuva no telhado escorregando
os cajus de tão maduros caindo,
a ventania agitando os altos coqueiros,
e da cozinha sentia aquele cheiro ,
cheiro de café quentinho
leite derramando
o carteiro chamando e a carta entregando,
as moças se enfeitando e encantando,
os rapazes de olho ,sempre espreitando,
a mamãe vigiando e espantando
papai ali, sempre calado, labutando,
e botando comida na mesa para aquele bando pueril.
E assim a vida fluiu
crescemos
e tudo sumiu...
E sobraram os encantados fantasmas que passeiam
de noite
e as vezes de dia,
procuram de novo aquela antiga harmonia.
Então, de noite, depois de viver minha real vida
durmo,
e em meus sonhos,
volto pra casa,
e vivo novamente
minha encantada vida .
Minha vida
encantada
vivo novamente ...



sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Miserável ordinária cretina


Andava sempre nas nuvens ,
ouvia acordes vindo de harpas
sentia a brisa suave em seu rosto , 
enxergava o azul do firmamento celeste
conseguia ver passarem revoadas de garças ao
amanhecer procurando alimento
e voltava a vê-las ao entardecer procurando abrigo .
Então ela pensou :
Não sou desse Mundo !
Aí tudo se arrebentou e caiu no solo frio
da vida real .
Ouviu palavras ferinas ,
miserável
ordinária
cretina ...
Será mesmo que ouviu isso ?
Ou o inominável proferiu aquilo ?
E assim a vida é .
Real ...
E os rebentos ,vão
arrebentando tudo a sua frente ,
não são o que eram
viraram apenas gente
e gente é só gente
rente e quente
só gente
nunca filho da gente ...
E ela foi empurrada das nuvens
percebeu que só ouvia blasfêmias
sentiu o mormaço esmurrando seu rosto
enxergou o negro da noite eterna
a revoada era de abutres espreitando sua carne .
Então ela pensou :
Eu sou desse Mundo !
Sou
miserável
ordinária
cretina.
E assim seguirá com
o pesado
fardo de
sua sina .