terça-feira, 22 de novembro de 2022

Vestido vermelho de bolinhas brancas

 Vestido vermelho de bolinhas brancas 


Lá pela década de 70, final de ano as moças Noronha Brasil preparavam-se para as festas de final de ano, e elas corriam à loja  de tecidos Casa Blanca para preparar e enfeitar nosso natal, compravam cambraias, algodãozinho, florais, gripis, cetim, crepe para as moças e anaruga e poás para a menina, que no caso era eu, para os rapazes tergal para fazer as calças boca de sino, bem vincadas, para os meninos brim indigo blue, eles rasgavam roupa com muita facilidade, então brim neles.

E para espairecer davam uma paradinha na Leão do Sul caldo de cana e pastel quentinho, seguiam pela Guilherme Rocha até a José de Alencar, vinham saltitantes e serelepes no ônibus da Cialtra, o motorista parava na porta das belas moças, que agradeciam com sorrisos juvenis, o Benfica era nosso reduto, e o quintal encantado nosso QG.

E a máquina SINGER preta seria limpa, lubrificada, para as suas mágicas pedaladas, tesouras, linhas, entre-meios, agulhas, dedal, papel pardo, trena, entretela e assim começava aquele ritual, que iria nos unir todos engomadinhos, em nossas roupas de festa.

E assim alegres elas cosiam nossas roupas.

Eu já havia crescido um pouco, aos quinze media 1,70m.

Essa criança está muito alta !

Era assim que elas e eles me viam.

Então meu vestido vermelho de bolinhas ficou um desbunte, lindo, perfeito, três babados, corpo justo, busto desenhado e laçarotes em forma de alças, eu me sentia a própria, e assim passeava com ele, na festa de fim de ano escolar, fiz sucesso.

Quem fez esse vestido lindo, perguntavam as arquinimigas da escola de freiras.

Edmeia Mendes ! A Modista famosa ? Ela mesma.

Mentira pura, foi minha irmã Rogena, estudante de enfermagem lá da Unifor, era fina costureira muito caprichosa, mas eu estudava num colégio de elite, então era uma mentirinha suave.

Então o ano findou, o vento girou e a mamãe surtou, achou de me levar à Bahia. Vou não ! Vai. Vou não... Vai.

E no ano seguinte lá estava eu, a primeira visão foram as casas penduradas na montanha, minúsculas casinhas amontoadas na única entrada para Salvador, um cheiro de cigarro, era a Sousa Cruz, Avenida 7 e O Adamastor com uma vitrine de artigos masculinos,  Palace Hotel segundo andar olhando para Castro Alves  que não era muito meu íntimo falava do Navios Negreiros eu gostava mais era do Dragão do Mar, na época já havia lido na surdina mais de dez do Jorge o Amado, quase a coleção completa, ali não era meu mundo, não mesmo.

E passei odiar aquela que me largou ali, me tirou tudo e mais um pouco, só por capricho, quando a vi sumir naquele  FIAT 147 vermelho, subindo a rua Chile, pensei... 

Agora sou eu sem Deus, pois ele foi com ela, naquela 324 de mão única, de volta ao meu lar, meu lar longe daqui, respirei, respirei, suspirei, chorei, chorei e a odiei, destá, destá mamãe.

Então num treze de janeiro do último ano da década em questão, vesti meu vestido VERMELHO DE BOLINHAS BRANCAS,  e fui ao lugar mais inóspito que existia, ao descer do São Matheus ás dez da noite um belo rapaz de madeixas douradas me viu e profetizou. Vou casar com essa moça do vestido vermelho de bolinhas brancas...

E depois de muito tempo, vivendo no inóspito lugar que evoluiu devagarinho, admito que Deus foi com a mamãe, mas deixou uma proteção poderosa comigo, a MENINA BENIGNA CARDOSO a primeira beata cearense, que me acompanhou até aqui, pois eu estava com um vestido semelhante ao seu quando, foi martirizada por um jovem que queria possuí-la, e não conseguindo o feito a matou com golpes de facão e cortou-lhe a cabeça.

E eu tive a maior sorte do mundo ao ser encontrada por um rapaz de boa fé.

Mamãe, descanse em paz e perdão por ter sentido ódio, a providência divina a usou para que eu fosse feliz, obrigada por ter sido assim essa mulher de forte domínio e também cheia de fé...

E que as meninas e mulheres não sejam martirizadas por dizer NÃO.

Não, é Não.

terça-feira, 11 de outubro de 2022

 

O Sol aqui no semiárido do nordeste mais precisamente na Bahia nasce mais cedo, pelo menos para meu marido e consequentemente para mim, o despertador zoa desesperadamente ás 04:00 am, ele se estica, vai até à janela e começa a gritar pelas vacas, está na hora da ordenha, e começa a chamar suas vacas pelo nome, uma por uma, e elas atendem ao seu chamado, mugindo e balançando seus chocalhos, e pacientemente vão para o curral de pedras e assim começa a lida desse homem, que nasceu e se criou no trabalho Hercúleo.

E eu fico a me esticar mais um pouquinho, na cama ainda quente do corpo daquele mouro que levantou-se para sua lida.

As garças passam em brancas revoadas, os pássaros fazem evoluções nas árvores, o galo começa a cantar aos primeiros raios do sol, que vem derretendo as nuvens á sua frente, patos, galinhas, gansos, cachorros, e o trem do Caipira surge nos trilhos, apitando para os répteis desavisados.

Ouço o tilintim das mensagens do celular, levanto vou á janela  e me deparo com um beija flor parado quietinho no galho da maravilha grená, sorrateiramente começo a filmar e ele voa  e para no parapeito da janela, eu fico feito estátua, nem respiro, ele olha, olha e volta para o galho da árvore.

Tentei filmar, mas ele é um milhão de vezes mais rápido que meus olhos.

Então respondi uma mensagem de um amigo...

Nossa amiga você acorda muito cedo !

Falei do beija flor...

Você mora num paraíso, aqui os pássaros sumiram.

O aqui é lá no leste europeu, onde o frio atravessa os ossos, mas o maior problema é estar perto do Putin, uma Besta Fera da contemporaneidade, enquanto conversávamos um caça corta os céus sobre sua cabeça, num voo cheio de ganância e angústia, espalhando o medo de uma guerra iminente, onde só morrem os inocentes.

Enquanto o líder dessa barbárie esta num palácio, cheio de tesouros á custa da morte de seus lacaios.

Aqui voa o beija flor, lá voam caças que cospem fogo, os lagos não tem mais cisnes, nas águas jorra o sangue derramado de homens que só queriam estar numa nação livre.

Vem meu amigo, volta, a única desgraça do nosso país, são nossos políticos, claro que não agravando a todos, somente 99,9 por cento.

Ah, e Deus é Brasileiro...






terça-feira, 4 de outubro de 2022

 De novo atravesso a dimensão de minhas saudades, vou flanando até aquele lugar encantado.

Quando a noite vem e a algaravia cessa, entro na alcova abro a janela e vejo a Lua encostar no parapeito, então deito e chamo o sono que produz meus sonhos fantásticos e assim vou viver, vou fazer renascer os dias de minha primeira infância, os dias em que existiam meu pai, minha mãe, meus irmãos e irmãs, naquele quintal encantado de árvores gigantes frondosas e mágicas.
Aqui anoiteço, mas ao atravessar a tênue linha das dimensões humanas, lá o dia dia amanhece.
O cantar do galo pedrês, o badalar do sino da igreja em sincronia com o relógio de carrilhão ali na sala, desperta a meninada e a moçada, um único banheiro faz o trânsito congestionar, época de banhos absolutamente individuais, resolvida essa procela, os odores de espuma de barbear, gel de cabelo, pó para evitar chulé, pó de arroz, patchoulli, lavanda, desodorante spray, leite de rosas, batons encarnados e a toalete está completa.
Uma mesa gigante recheada de aromas e sabores, café, leite derramando, suco de nossas frutas, cuscuz quente com uma espessa camada de manteiga derretendo, tapiocas molhadas no leite de coco, pão, ovos fritos na banha, fartura, muita fartura vinda do suor do pai mecânico, que casou com a filha do fazendeiro, a mais bonita porém a mais valente.
E lá se espalhavam pela capital Alencarina, caminhavam rumo ao futuro.
Ah ! pobres moços e moças que estavam deixando de ser crianças,
eu ia para o primário dentro dos muros do 23º Batalhão de infantaria, também cheio de árvores gigantes, meio dia, que beleza, o primogênito reconduzia a meninada para casa, casa não, lar, de novo a mesa farta, feijão, arroz, carne, macarrão, salada, maionese, sucos, sucos, sucos, gente faminta e depois satisfeita de bucho cheio.
O mecânico intelectual, engenheiro melhor que o professor Pardal, que mirabolava e inventava suas máquinas e parafernálias, me viu a se balançar no galho do gigante cajueiro, treinando pra morrer, caía mas num morria...
Veio na surdina da manhã, surdina mesmo, pois o quintal era só dele, a mamãe ocupada na cozinha, enquanto aprendíamos o bê-a-bá, pegou uma madeira fornida, passou a plaina e fez quatro buracos com a sua cerra copo, comprou corda de sisal de grande espessura, e fez um balanço de primeira, e o amarrou no galho mais firme do cajueiro.
Depois do almoço ouvi um chamado que só ele e o primogênito usavam.
Cumade Cirninha !
Era eu.
E fui prontamente, sou eu, e fui...
E diante de meus olhos incrédulos, tive a visão do paraíso, um balanço, e o papai ali a me esperar para ajustar a altura, minha Nossa Senhora, menino, eu estava sem acreditar.
E subi naquele balanço que por anos a fio me embalou pra lá e pra cá, meus cabelos arrastavam no chão, enquanto os pés tocavam as nuvens e de noite tocavam a Lua, mas o mundo girou, vieram muitas primaveras mas veio o outono, quando as folhas caem, o primogênito prematuramente se foi, o papai se foi também, e o cajueiro inacreditavelmente nesse ano caiu, ruiu, desistiu de estar ali, sem crianças ao seu redor sem o balanço mágico.
Mas em meus sonhos encontro os dois que ficam a me embalar no balanço que me leva no mais alto dos céus, meus cabelos ainda encostam no chão e meus pés ainda alcançam a nuvens e a Lua...
Então quando anoitece e todos dormem eu acordo para a vida de uma criança feliz, uma criança que ainda esta aqui em meus sonhos encantados.


segunda-feira, 29 de agosto de 2022

 Desistir 


O vazio dentro de mim,se assemelha a um  barco que tem medo de atracar no cais, mas o mar  me chama, ele clama e em lágrimas me derrama, e não me ama.

É um pedaço de mim,

que não me pertence, mas toma meu corpo frio, meu corpo louco,

o meu eu rouco,me toma um pouco do muito, que não sou.

E te digo a mim, tu é quem mesmo ?

Sei não, nasci aqui ao relento, em meio ao vento ,não tenho alento, a lente, a mente, que por hora ri, e noutra chora, e não mora em lugar nenhum.

E eu fico sem jeito, e me deito onde jaz minha alma fria, a brisa me enebria, não tenho guia, eu penso que tu sou eu ou eu sou tudo aquilo,reduzido a nada, na água se foi, ou se esvai, sem nunca ter vindo.

Tento  esquecer, que existo, insisto em não ser visto, e da cruz desisto, eu pulo, o muro, a ponte, do trem, não vem, não vou ,não fui, não sou,não ando, rastejo,pelejo, tenho um desejo, só ser ou ser só.

Essa face calada, exilada, amordaçada, amaldiçoada, cansada de viver, sem medo de morrer ,sem medo da porta, pensando na sorte de ser apenas pó, sem nó, sem dó, sem sol, sem sal, sem mal.

Preciso de um sonho, pode ser medonho, mas um sonho, onde eu fuja de mim, e me salve do meu próprio eu, cansei de lutar comigo, sou muito fraco para conter minha força em não querer viver.

Ai vem alguém escondido dentro de mim...

Vai desistir ?

Eu sou tu, e quero morrer vivendo, sofrer de sangue quente, quero estar com meus pés rente ao chão, e não numa lápide eretos, quero sentir meu coração pulsar, quero acreditar, pular no mar, derrubar o muro, atravessar a ponte, viajar de trem, quero ir com você muito além...

Além eu , além tu, além mar.

Vou te ensinar a  amar, amar tu, amar eu, a marte, a vênus, a lua, a tua alma linda,seja dessa vida bem vinda.     


Aos meus alunos e alunas que lutam com eles mesmos...   Adriana Noronha.

sábado, 27 de agosto de 2022

 Eles estão voltando

Com seus corpos robustos, cabelos alinhados, e com aparência de boas criaturas, os que juntam-se a eles também tornam-se réplicas, idênticas.
Saem aos montes de seus palácios erguidos a sangue e fogo, e revoam sobre a nação, são as aves de rapina mais perigosas que existem nesse vasto mundo vasto.
Deixam suas moradas suntuosas, privam-se de estar à sua mesa onde degustam, Bisteca alla Florentina, Polpetone, Cotoletta alla Milanese, Raviole, Gellato, acompanhado de uma garrafa de Chateau Lafite Rothschild, sem mencionar o serviço de porcelana, talheres de prata, copos e taças de cristal Baccarat sobrepostos no mais puro linho egípcio, acima de suas cabeças candelabros de bronze, uma varanda para o Paranoar, um lago tão artificial quanto sua honestidade.
Na manhã seguinte começam com sua tenebrosa caça ao animal mais manso que há naquelas redondezas inóspitas, deixam em casa seu sapato de cromo alemão, e colocam um dockside casual,
para descer ao patamar de sua caça.
E o Capitalismo será sustentado por aquelas criaturas que tem fé no socialismo, e o famigerado solta sua lábia que engana até o próprio Demo, eles andam em bandos pelas ruas sem pavimentação, com o esgoto que corre à céu aberto, entram em casinhas minúsculas onde vivem, aliás, se apertam oito, dez, quinze...
Lá não há split de 5000 BTUs, TV smart, cama king, geladeira de duas portas, fogão de indução, lá não tem nem alimentação, não há carne, leite, ou feijão.
Mas a caça tem fé e se alimenta de esperança, de um dia existir um mundo melhor para suas crianças.
E aquelas aves de rapina, os enganam bebendo água no copo de extrato, onde também são abraçam e com muito esforço beijam, assim como Judas o fez...
Falam em crescimento econômico social, melhorias para aumentar emprego e renda, o fortalecimento das políticas públicas, aumento das vagas nas creches, escolas, universidades para pardos, negros indígenas, e vão ludibriando seu plantel, sua manada...
E assim eles vão transformando o socialismo na mais pura filosofia do fracasso coletivo, transformado na pregação da inveja mútua, e aumentam a crença da ignorância, os políticos fabricam as mazelas do mundo, fomentam a perpetuação da miséria, para que assim sejam políticos vitalícios na sua inutilidade e consequentemente PODRES DE RICOS.
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Andre Leandro Crespo Bispo e Vera Lúcia Reis

quarta-feira, 24 de agosto de 2022

     Abri os olhos naquela manhã lânguida e imediatamente vi o sol,em todo seu resplendor.

Mas de repente, me vi também ali olhando os meus pés, e eu não estava deitada, estava diante de mim, ali, é ali e eu aqui.
Vixe !
me aproximei, com receio, tatiei, apalpei, apertei e belisquei.
Vala-me São francisco...
Eu não acordei.
Estava ali jazendo.
Oxe ! Ainda não era a hora, a tão não esperada hora mortis.
Mas pensei que poderia estar no lucro, eu ia encontrar a mamãe, o papai, reencontraria o primogênito, o irmão que foi ceifado, eitha ia conhecer o outro Reginaldo que morreu antes de eu nascer e todos os outros agregados na minha vida lá na terra.
Meu Jesus, ainda estou em minha alcova, não fui ainda pra cova, aquela de sete palmos, eu viva na do leões.
Ei ! Tu mora no nordeste. Ai é !
Então eu vivia na cova cheia de caititús.
De repente ouço Vivaldi.
Vivaldi ? Sim aquele das quatro estações...
Mas um vento passou e a música mudou, veio um som grave, opaco, cheio de tambores gigantes.
A Carmina. É, a Umburana !
Eu tava falando com quem ?
Com você mesmo, com a tua consciência, que está cheia de resposta sem perguntas, cheia de perdões sem erros, cheia de coragem sem medos, cheia de rancores herdados, e repleta de desejos ocultos não realizados.
Você não pode entregar meus podres, tu sou eu, ou eu sou tu.
Tu, tu, tu ,tudo é tu, e o eu ?
Alguém lá na triagem das portas de cima e de baixo, viu minha conversa, comigo mesma, e ficou encabulado, observando minha longa conversa comigo.
Essa vai dar trabalho, fala demais, é muito indagueira, e hoje tô afim de paz, silencio, mansidão, hoje me inspirei no funcionário público, ele existe mas nada faz.
E a Compadecida vinha passando, me olhou e disse.
Mande de volta, ela reza sempre pra mim, sempre me clama, ainda é uma menina pressa num corpo adulto, tadinha, e teve a ousadia de sonhar comigo.
Exatamente, eu tive que ir no sonho dela e ficar conversando horas a fio, nós duas sentadas numa pedra falando de coisas da vida, ela realmente gosta de mim.
E assim foi feito.
Eu acordei de mais um sonho, e tive a oportunidade de continuar sonhando acordada, no dia que vou de novo transcender e estar conversando com a Imaculada.
O trem apitou eu pro meu corpo voltou, e vou seguindo, e vivendo nessa cova cheia de caititús.
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Raquel Noronha, Sara Mota e 5 outras pessoas
ova de Caititús

terça-feira, 26 de julho de 2022

Gatixa, a lagartixa  


Um dia a lagartixa, entediada com sua pacata vida, naquela casa de paredes caiadas, resolveu descer para dar uma volta nos arredores.

Afinal ela sempre estava passeando nas paredes, pra lá e pra cá, sempre perto das telhas. 

Ela estava cansada de brincar com sua sobra, que se agigantava quando passava perto do candeeiro.

Saiu num dia ensolarado, passou pelo jardim, foi indo, indo, e atravessou a cerca.

Tu vai aonde ? 

Perguntou o morceguinho. Vou passear.

Cuidado ! Tu é lagartixa de parede. 

Eu sei !

E lá se foi ela.

Passeando pela vereda, viu uma flor e se encantou, sentiu o cheiro do manjericão, que sensação, e foi indo, indo.

De repente atravessa a vereda uma cascavel...

Bom dia. Falou a lagartixa 

Tá falando comigo ?

Nossa que pele linda a sua, parece uma armadura, que desenho lindo.

Essa não é certa da bola. Pensou a cobra.

Tu sabe com quem está falando ?

Sei não ! 

Mas deixa eu me apresentar.  

Sou Gatixa, a lagartixa de parede.

E você ?

Sou somente uma cascavel,  a responsável pela morte de todo mundo.

Viuge ! 

Isso é fofoca né ?

Eu gostei de você, adorei esse chocalho na sua calda, é o máximo. 

O que você faz da vida ?

Mato gente !

Adorei teu senso de humor.

Hoje não tô num dia bom. Retrucou a cascavel. 

Então abra seu coração, me conte a sua história.

Eu sou a culpada da morte de todos por aqui, se morre um bode, sou eu, uma vaca sou eu, um caititu, sou eu, um tabaréu sou eu a culpada.

Criatura deixe de besteira, isso é intriga dos invejosos, achei você tão tranquila, liga pra isso não.

Você não sabe metade da missa.

Pronto vou te provar que tudo é culpa minha.

Vamos esperar passar um tabaréu por aqui, quando ele se aproximar,  você morde a canela dele, e se esconde, e eu apareço.

Tá bom !  

Fique ligada.

E lá vem o  tabaréu, tranquilo para mais um dia de trabalho na roça.

A gatixa mais que depressa ,mordeu o calcanhar do homem, correu, se escondeu, e a cobra apareceu...

Meus Jesus ! E o tabaréu caiu morto em cima da cobra.

Viu ! Num te falei ! 

Calma amiga, foi coincidência.

Então tá, vamos inverter, vamos esperar outro tabaréu,  eu vou morder, me escondo e você aparece. 

Tá bom !  Falou a Gatixa.

E lá vem pela vereda outro tabaréu.

A cascavel veio sorrateira, mordeu a canela do homem, se escondeu rapidamente, e a lagartixa apareceu.

Peste, praga, quer me matar de susto, pensei que fosse uma cascavel. 

Chutou a lagartixa pra longe, e continuou o seu caminho.

Viu aí ! 

O cara foi embora, eu mordi, mas ele viu foi você, e  não morreu.

E assim começou uma longa amizade entre a cascavel e a lagartixa de parede.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2022

 You can always come home

O tempo nos faz crescer.
o vento nos empurra para longe, espalha as folhas de uma frondosa arvore por ai, por ali, acolá, eu fui parar onde não tem mar, mas a lua que nos iluminava e o sol que nos aquecia, me consolam...
E a nossa casa não se desmancha em nossa mente, mesmo que um monstro chamado progresso a tenha derrubado sem piedade, sem ouvir nossos gritos pueris.
Então quando a noite vem, deito na alcova e adormeço, saio do mundo dos adultos e volto para minha casa, meu pai, minha megera mãe, meus irmãos, minhas irmãs, minha bicicleta, minhas bonecas.
E retorno ao mágico quintal, herança do avô paterno, que apesar de morto, nunca saiu de lá, estava sempre a nos assombrar, com sua alma que se recusava a ir, para não sei onde.
E em meus sonhos sempre há alguém a minha espera, a me acolher num longo e terno abraço, um abraço aconchegante e quente, e olho ao redor, está tudo como era, foi, será...
E aquela criança será feliz de novo por encantados instantes, o cheiro dos cajús, o aroma do café, a fumaça provocada pelo eletrodo encostando no ferro, as bicicletas Barra Forte, os gritos da menina a correr na hora do banho, a biblioteca própria repleta de tudo, o violão, os beliches, o baú das redes.
Nós juntos sem ódios ou rancores, só fraternidade, irmandade, confraria, brincadeiras e alegria.
Em meus sonhos sempre pulo o muro, ainda tenho pernas fortes e robustas, e sempre há quem me apare, me abrace me pegue pela mão, e me leve ao meu mundo real.
Tu tava aonde menina ?
Não sei !
Tã na hora do banho, pentear esse cabelo, colocar o laço de fita, pra ficar uma menina bonita.
E assim eu volto a viver.
Você sempre pode voltar para casa.
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Gosto
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