sábado, 24 de novembro de 2018

Casa da Tia

Em frente á Praça Presidente Roosevelt, na esquina da rua Ana Neri com Carlos Câmara, existia uma casa branca de varanda em formato de arcos, com muro chapiscado de uma altura que da praça dava para ver as papoulas encarnadas, grená e brancas, que ornavam o jardim, era a casa da Tia Bibisa, a tia rica, a mais doce das Noronhas, uma réplica da Raquel de Queiróz, seus filhos já eram quase crescidos, e nós seus sobrinhos adorávamos visitá-la.
Ao entrarmos havia uma sala espaçosa,com piso de assoalho, os quartos do lado sul, ao redor muitas rosas, janelas abertas à vida ,ao vento, ao sol, após a sala a cozinha, o lugar mais encantado daquela mágica casa, o quintal ficava há alguns poucos degraus abaixo,muito verde, mas voltando à cozinha, uma mesa de jacarandá rodeada com cadeiras de palhinha, adornada por uma toalha de rechilieu, feita por suas mãos de fada, no radio tocava Dalva de Oliveira,e elas cantavam junto com ela, Hino ao amor, entre outras, como Bandeira Branca, Errei sim, ai a mamãe vinha com sua voz e cantava Vingança, " mas eu gostei tanto ".
A Maria Justa nos levava sempre à tarde, enquanto corríamos soltos na Praça do Jardim América, as Noronhas se punham a fazer os nossos sonhos em forma de bolos encantados tipo Sousa Leão,Luís Felipe, Espera Marido, pão de ló, e bolo mole, o leite da vacaria do Benfica, lá na Carapinima entregue em garrafas de vidro, branquinho feito nuvem, um doce feito dos cajus de lá de casa, o pão de milho feito no prato com pano amarrado, tapiocas regadas ao leite de côco, uma panela de barro cheia de coalhada, o pão da bodega do seu João, aquela quase em frente à Vivenda dos Amaral, a nata com uma pitadinha de sal, o suco de graviola do pé, mas se tinha uma coisa que invadia de alegria aquela praça de árvores frondosas, era o cheio do café torrado na hora, que se espalhava como mágica, a nos chamar pra dentro daquela encantada casa.
A mamãe vestia seu belo vestido de poás rosa ciclame, a Tia Maria do Carmo no seu vestido de linho escuro finamente bordado por ela mesma, mas a Tia Bibiza sempre muito pudica vestia branco, um vestido de laise, que denotava a pureza de sua alma, os óculos dourados valorizavam suas madeixas grisalhas presas a um coque elegantemente penteado sua voz mansa nos ordenava que lavássemos a mãos, porcelana cheia de flores campestres, chaleiras, bules, xícaras,copos finos e longos, talheres acho que de prata, e nós ali comendo antes com os olhos, e depois se fartando daquelas delícias que só as Noronhas lá de Redenção sabiam fazer.
As moçoilas preferiam continuar na varanda a flertar com os marmanjos, daquelas cercanias, entre um olhar e outro, uma corrida à cozinha para uma fatia de bolo oferecer aos lindos rapazes, que ficavam á espera do maior prêmio, talvez um doce beijo roubado.


O Sol sumia a oeste, e as crianças esqueciam que o dia tinha fim, e após a merenda, a louça pra lavar e as fofocas para atualizar, quando o crepúsculo vinha, hora de pedir a bença as tias, e tomar o rumo da Avenida da Universidade, a fila da prole da mamãe voltava feliz ao nosso também lar doce lar.

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Alguém que já sentou na lua.