sábado, 27 de julho de 2019

Tudo outra vez
O tempo veio, o tempo foi, me fez crescer, e pra longe me levou, um dia asaudade me empurrou de volta.
Ei, eu vou ali.
Vou fazer meu coração pulsar alegre, vou lá no Ceará...
E fui.
Mas ao chegar eu vi a minha casa no chão, a casa em que cresci , lá naCarapinima, cheguei tarde e não deu tempo de pegar um pedaço sequer do reboco ou um caco de telha, ela ruiu,não achei nada mais não.
Onde ficaram as panelas,
as cadeiras,o baú da vovó,
os livros e a nossa Enciclopédia,
e as minhas bonecas de pano,
a lata da farinha, do feijão,
o fogão,
a mesa gigante onde a mamãe nos serviu o leite e o pão,
o pé de jambo ,
o cajueiro,
a azeitoneira onde subia todas as noites a sonambular,
os pés de coqueiros que sustentavam as roupas da meninada no nosso imenso e colorido varal ?
Meu Deus, cadê eu, minhas irmãs e meus irmãos !
A oficina do Seu Brasil !
Senti um calafrio e calei , mas queria mesmo era gritar,berrar.
Então só fiz chorar, e minha ausência lamentar.
Um algoz chamado progresso em forma de metrô matou o trem do Otávio Bonfim e engoliu vorazmente um micro mundo em beneficio do mundo macro .
Mas posso reconstruir tudo outra vez ,
a algaravia e as arengas da meninada,
o cheiro delicioso do café, do leite e do cuscuz que vinha da cozinha,
os latidos misturados aos miados dos gatos ,
ouvir, Menina da ladeira na radiola,
ver o florescer das papoulas,
subir e arrancar as frutas das árvores ,
ouvir o som do sino da igreja de Nossa Senhora dos Remédios a nos chamar a rezar .
As brincadeiras de roda,o pega pega,
as estórias de terror contadas no escuro do quintal ,
a vela acesa dentro da lata ,
o balanço no cajueiro indo e vindo ,
o coral do ronco de todos a dormir ,
o terço gigante pendurado na parede ,
o presépio, a arvore enfeitada com algodão.
E o melhor de tudo andar pela nossa casa de paredes alvas e cheias de desenhos infantis pueris ,
,roubar as garrafas de cajuína que curtiam no telhado,
entrar pelas portas sem ferrolhos pois nada ficava trancado.
Eu fecho os olhos e colho tudo de bom que lá existiu ,
felicidade assim nunca se viu ,
minha vida não se perdeu e tudo que vivi foi o que valeu ,
e lá no Benfica, eu começaria tudo outra vez ...
Adriana Noronha .

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Alguém que já sentou na lua.